quinta-feira, 19 de julho de 2012

O GAROTO DE BICICLETA



Hoje vamos de filme outra vez. A escolha recaiu sobre o drama belga O Garoto da Bicicleta, dos irmãos e diretores: Jean-Pierre Dardenne e Luc Dardenne, filmado em 2011. Os atores principais são Thomas Doret e Cécile de France.
Cyril (Thomas Doret), um garoto de onze anos, foge do internato para procurar o seu pai, pois já fazia algum tempo que não recebia visitas dele. Ao chegar ao seu apartamento, percebe que seu pai não mora mais no local, pelo contrário, fugiu da cidade e o abandonou, sem deixar nenhum recado. Outra constatação decepcionante para Cyril foi o fato de seu pai ter vendido sua bicicleta de estimação, objeto que adorava por ser uma ligação afetiva com seu genitor, pois fora presente dado por ele. Ainda no prédio onde morava, Cyril é encontrado pelos instrutores do internato para levá-lo de volta, ele resiste agarrando-se às pernas de uma mulher desconhecida, chamada Samatha (Cécile de France). Esse encontro passa a determinar o desenvolvimento da história.
O Garoto da Bicicleta não é exatamente um filme eletrizante. A narrativa simples, o ritmo cadenciado, as emoções contidas das personagens não provocam arroubos sentimentais no espectador. Não que isso prejudique a qualidade da obra ou a deixe desinteressante. Inclusive, em pesquisa, descobri que essas características são valorizadas pelos diretores. Eles são adeptos do cinema mais enxuto, meio no estilo do movimento Dogma 95 de Lars Von Trier: uso de elementos básicos na produção, controle das emoções, ausência de trilha sonora, atores desconhecidos, tudo para privilegiar o enredo e as relações humanas. Essa linha é mantida no O Garoto da Bicicleta, com exceção do uso da trilha sonora e a presença de uma atriz um pouco mais conhecida como protagonista.
Dentre as características citadas, a que mais salta aos olhos é o comedimento de emoções por parte das personagens, com exceção de Cyril, a quem são permitidas algumas reações emocionais, algum descontrole. O pai ostenta uma frieza polar, que chega a ser assustadora. E Samantha reage a tudo, não importa se fatos alegres ou tristes, com sobriedade quase monástica, até difícil de aceitar, principalmente para nós latino-americanos de sangue quente.  Mesmo demonstrações físicas de afeto e ternura em relação ao menino são comedidas, apesar do grande amor que ela sente por ele.
Dois pontos positivos se destacam no filme. Os diretores abstiveram-se de traçar um perfil psicológico de Samantha. Assim, não se preocuparam em apresentar uma justificava para algumas decisões tomadas por ela, por exemplo, o fato de ela se identificar e se envolver rapidamente com o garoto. Dessa maneira, podemos enxergar a vontade de amar maternalmente outra pessoa sem que, para isso, seja preciso usar como muletas traumas passados ou carências atuais. Samantha é uma mulher segura, resolvida, estável financeiramente. O que a move é o amor por si só.
Outra virtude dos irmãos Dardenne é nos desafiar na nossa moral, quando nos apresenta um garoto nada simpático, que não provoca empatia ou compaixão, pelo contrário, até nos dá vontade de lhe aplicar alguns corretivos. Configura-se um desafio porque se mostra mais fácil aceitar uma criança desconhecida quando ela se apresenta frágil, conformada, submissa.  Por outro lado, parece ser mais difícil amar um desconhecido, ou mesmo se abrir para tentar compreendê-lo, quando ele é problemático, arredio, irascível, teimoso, como é o caso do protagonista.  
Por não atingir as emoções de imediato, o filme não causa impacto no momento em que o vemos, todavia provoca esse efeito depois, quando refletimos sobre ele. Identificamos um chamamento à compreensão, à paciência e, sobretudo, ao amor paternal ou maternal. Vemos que esse sentimento pode surgir, de maneira forte e arrebatadora, sem necessariamente estar condicionado a laços sanguíneos.
Ah! Devo avisar sobre o final do filme. Não, não vou contá-lo. Só alertar que tudo acaba de forma seca e brusca. Os diretores não nos preparam para um fechamento. Sabe aquele momento em que a camêra se distancia, as luzes se apagam e começa uma música, tudo lentamente? Pois é, esse momento não existe. Fica a sensação estranha de uma pergunta que nunca será respondida. Mas...tudo bem.
Enfim, recomendo.
Até logo!

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