terça-feira, 10 de dezembro de 2013

DEBAIXO DE ALGUM CÉU



Livro bom, para mim, tem que cumprir alguns requisitos. Eis os principais:

a) Boa história: criativa, empolgante, surpreendente, interessante, coerente e verossímil;
b) Personagens inusitadas, complexas e bens construídas;
c) Narrativa fluida, envolvente e bem articulada;
d) Vocabulário rico;
e) Reflexões interessantes, daquelas que te fazem interromper a leitura e levantar a cabeça para pensar no que o autor escreveu;
f) Boas sacadas.

50 Tons de Cinza e O Alquimista (já resenhados aqui no blog), por exemplo, não cumprem nenhum desses requisitos; considero-os, portanto, livros ruins. Por outro lado, Memórias Póstumas de Brás Cubas e Crime e Castigo (ainda não resenhados aqui) atendem a todos esses itens com louvor, o que os torna, na minha opinião, excelentes livros. Para descrever minha impressão sobre Debaixo de Algum Céu, resolvi submetê-lo a esse check list. Essa obra foi aprovada em alguns pontos e reprovada em outros.

Antes de detalhar a avaliação, vou falar um pouco mais sobre o livro em questão. Debaixo de Algum Céu, obra do escritor português Nuno Camarneiro, foi o vencedor do Prêmio Leya de 2012, concurso realizado em Portugal pela editora de mesmo nome, que abre oportunidades para romances escritos em língua portuguesa.  A título de curiosidade, um brasileiro foi o vencedor da primeira edição desse prêmio (2008), trata-se de Murilo Carvalho, com o livro O Rastro do Jaguar.

Debaixo de Algum Céu conta a história dos moradores de um edifício localizado em algum ponto do litoral português. Entre os moradores, temos: um jovem solteiro, especialista em informática, em crise moral por conta do trabalho que está realizando; um padre em conflito espiritual; uma viúva, que perdeu o marido recentemente e conta somente com a companhia de um gato; um casal em crise, com uma filha recém-nascida; uma família comum (pai, mãe, uma adolescente e um menino), com problemas comuns; uma mulher sozinha e angustiada por conta de alguns erros que cometeu; um zelador excêntrico.  Esses são os seus principais personagens. O romance relata o que se passa na vida dessas pessoas do dia de Natal até o primeiro dia de um novo ano.

Apresentado o livro e seu conteúdo, vamos ao resultado da minha avaliação, segundo os critérios elencados acima:

a) Reprovado. A história, ou melhor, as várias histórias do livro são coerentes e verossímeis, mas faltam criatividade e surpresa;  e as tais histórias tampouco nos empolgam. Um padre confrontado com desejos carnais é um tema mais do que batido nas artes. A viúva que ainda cultiva adoração pelo marido morto, uma mulher solitária e problemática, um casal em crise e a família padrão desgastada são histórias mais do que comuns. Nenhuma novidade.

b) Reprovado. Como se pode perceber pelo item anterior, as personagens são bem manjadas; algumas são até bem construídas, mas nenhuma é realmente complexa, nem inusitada. A única diferente é David, que tem a tarefa de criar pessoas virtuais para o mundo virtual gerido pela empresa que o contratou. Ele foge do comum, mas também não se destaca. Todas as personagens desse livro me pareceram bem distantes; não consegui me identificar com nenhuma delas; nenhuma delas me emocionou. Talvez pelo fato de contar várias histórias de várias pessoas distintas, o autor não tenha mergulhado profundamente em nenhuma, o que deixou fria a relação leitor/personagem. Ao final, fica a impressão de que não conhecemos ninguém direito.

c) Passa raspando. A narrativa é bem articulada, mas não é fluida e envolvente. Em vários pontos, achei-a meio amarrada.

d) Aprovado. Vocabulário muito bom.

e) Também foi aprovado. O autor nos oferece boas reflexões. Exemplo: "Oito dias são pouco tempo na vida de uma pessoa, mas nascer é só um dia e morrer também. Há alguns maiores e outros que nada importam, há semanas grandes como anos e horas infinitas, o tempo de uma vida é descontínuo e assimétrico." Outro trecho que nos faz para a leitura, levantar a cabeça e pensar: "Nesta história o tempo é medido em medos, um a cada dia, o tempo certo para que homens tremam e mudem." Há pensamentos muito interessantes, só os achei em número excessivo. Em alguns momentos, eles se preocupa mais em filosofar do que contar a história. Parece que ele tem filosofia para tudo, até para um farol na praia. Poderia ter maneirado a mão nesse sentido.

f) Reprovado. Não vi nada diferente, não vi nenhuma lance genial, inusitado ou marcante. 

Enfim, por tudo o que foi dito, não dá para considerar Debaixo de Algum Céu um excelente livro. Diria que é apenas bom. Não chega a ser perda de tempo lê-lo, mas está longe de ser uma obra marcante; não é daquelas que vai ficar na nossa cabeça por algum tempo. 





2 comentários:

  1. pra mim o que mata um livro é o desfecho não ser interessante...a história tem que acabar de uma forma reflexiva, impactante(não necessariamente feliz)...tem como esquecer a citação final de memórias póstumas?

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    1. Um bom desfecho é mesmo importante, mas o incluo no requisito "a" (boa história). A história tem q ter um bom final. O final de Memórias Póstumas é espetacular.

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